Referência: N Engl J Med. 2021 Jan 7;384(1):20-30
Na esteira de diversos ensaios que não conseguiram demonstrar a efetividade do tocilizumabe para a COVID-19, o ensaio Evaluating Minority Patients with Actemra (EMPACTA) nos traz evidências de que o tocilizumabe pode reduzir a progressão para ventilação mecânica mas não a mortalidade em curto prazo em pacientes hospitalizados com pneumonia por COVID-19. O tocilizumabe é um anticorpo monoclonal direcionado contra o receptor da interleucina-6 (IL-6). A IL-6, uma citocina pró-inflamatória, está frequentemente elevada nos pacientes com COVID-19 grave e acredita-se que ela desempenhe um papel importante na precipitação da resposta inflamatória que leva à síndrome do desconforto respiratório agudo (ARDS). O antagonismo aos receptores da IL-6 pelo tocilizumabe resulta em uma redução na IL-6 e em outras citocinas e reagentes de fase aguda. O tocilizumabe é cada vez mais prescrito de modo “off-label” para os pacientes com COVID-19, apesar de a evidência para o seu uso ser limitada.
Os pesquisadores do ensaio EMPACTA randomizaram 388 adultos (59% homens, idade mediana de 56, proporção medicação:placebo de 2:1) hospitalizados com COVID-19 e saturação de oxigênio < 94% para receberem 1-2 doses de tocilizumabe a 8 mg/kg por via IV ou infusão de soro fisiológico. Os pacientes do grupo do tocilizumabe receberam uma segunda dose nos casos de piora dos sintomas ou de ausência de melhora clínica. Todos os pacientes receberam os cuidados padrão, os quais podem ter incluído tratamento antiviral ou glicocorticoides sistêmicos. O desfecho primário de eficácia foi ventilação mecânica ou morte a 28 dias. Este ensaio de fase 3 enfatizou a inclusão de populações de pacientes em regiões com escassez de recursos nos Estados Unidos, México, Quênia, África do Sul, Peru e Brasil. Consequentemente, mais de 80% dos pacientes foram hispânicos/latinos, negros, nativos americanos ou nativos do Alasca.
Uma análise por intenção de tratar modificada dos 377 pacientes que completaram o ensaio constatou que não houve uma diferença significante na mortalidade a 28 dias (10,4% com o tocilizumabe versus 8,6% com o placebo). No entanto, a porcentagem de pacientes que tinham recebido ventilação mecânica ou morrido no dia 28 foi mais baixa no grupo do tocilizumabe que no grupo do placebo (12% versus 19,3%, p = 0,04, NNT de 14). Os resultados foram similares quando estratificados por idade, grupo étnico ou racial, região geográfica, uso de corticoides, uso de antivirais e número de doses de tocilizumabe ou placebo recebidas.
Deve-se notar que este ensaio foi financiado pela Genentech, a qual fabrica o tocilizumabe e projetou o ensaio, conduziu-o e analisou seus resultados. Apesar do potencial para vieses, o fato de não ter sido demonstrado benefício sobre a mortalidade com o tocilizumabe é consistente com ensaios anteriores que o avaliaram para a COVID-19. O Boston Area COVID-19 Consortium (BACC) Bay Tocilizumab Trial, por outro lado, não avaliou o tocilizumabe como efetivo para evitar a progressão para intubação. Os participantes deste ensaio estavam mais graves, no geral, e apesar de alguns terem sido tratados com remdesivir, nenhum recebeu dexametasona. É possível que a magnitude do efeito do tocilizumabe seja maior nos pacientes que recebem dexametasona, a qual agora é considerada um padrão de assistência. Apesar de o tocilizumabe ser caro, ele parece ser uma medicação relativamente segura com potencial para aliviar a demanda por recursos de terapia intensiva. Este estudo fornece evidências intrigantes que podem ajudar a definir o papel do tocilizumabe na COVID-19. Note que o Reino Unido aprovou o tocilizumabe recentemente, após resultados preliminares do Randomized, Embedded, Multifactorial Adaptive Platform Trial for Community-Acquired Pneumonia (REMAP-CAP), ainda não revisados por pares, demonstrarem melhora na sobrevida em pacientes com COVID-19 internados em UTIs.
Para mais informações, veja o tópico COVID-19 (Novo Coronavírus) na DynaMed.
Equipe editorial do MBE em Foco da DynaMed
Este MBE em Foco foi escrito por Nicole Jensen, MD, fellow em desenvolvimento docente e instrutora clínica em Medicina de Família na Universidade da Virginia. Editado por Alan Ehrlich, MD, editor executivo da DynaMed e professor associado de Medicina de Família na faculdade de medicina da Universidade de Massachusetts; Dan Randall, MD, editor adjunto para Medicina Interna da DynaMed; e Katharine DeGeorge, MD, MS, professora associada de Medicina de Família na Universidade da Virginia.