Dados limitados trazem evidências limitadas de danos pela terapia hormonal para indivíduos transgêneros

MBE em foco - Volume 6, Issue 18

Referência: Transgend Health. 2020 Mar 16;5(1):1-9

Indivíduos transgêneros enfrentam enormes barreiras no acesso à saúde, e duas das maiores delas podem ser a falta de experiência de grande parte dos profissionais e a limitação das evidências disponíveis. A maioria dos indivíduos transgêneros buscam a terapia hormonal definidora do gênero, ainda que muitos não especialistas hesitem em prescrever terapias hormonais sem que tenham mais informações sobre sua segurança. Estudos mostram que a terapia hormonal melhora a qualidade de vida das pessoas transgênero. Por outro lado, um estudo retrospectivo de coorte publicado no ano passado encontrou pequenas, mas significativas, elevações nos riscos de tromboembolismo venoso entre mulheres trans e de infarto do miocárdio entre indivíduos transgêneros que receberam terapias hormonais (Nota et al., 2019).

Um estudo de coorte de indivíduos transgêneros mais recente, realizado em um centro de saúde em Illinois, examinou a associação entre a terapia hormonal e eventos cardiovasculares tais como tromboembolismo, hipertensão e infarto do miocárdio. O centro atendeu mais de 6500 indivíduos transgêneros entre 2006 e 2018. Mais de 98% da coorte tinham recebido terapia hormonal, o que foi confirmado por revisão das prescrições em prontuário ou por registros laboratoriais. Um total de 2509 mulheres trans (idade média de 30 anos, 54,9% brancas) e 1893 homens trans (idade média de 26 anos, 66% brancos) participaram. Quase 40% dos indivíduos fumavam e mais da metade tinha sobrepeso ou obesidade (58,7% das mulheres trans, 66,6% dos homens trans). O desfecho primário foram os eventos cardiovasculares capturados por códigos da CID nos registros eletrônicos. A taxa de eventos entre mulheres trans expostas a estrógenos foi baixa: 0,8% tiveram um tromboembolismo venoso e 2,1% foram diagnosticadas com hipertensão. Não houve associação significativa entre os níveis de estradiol sérico e as taxas de tromboembolismo (odds ratio [OR] de 0,99, IC de 95%: 0,84-1,18) ou hipertensão (OR de 1,02, IC de 95%: 0,92-1,13) após ajuste para raça, tipo de seguro-saúde, HIV e idade e mediação para índice de massa corporal. A prescrição recente de progesterona foi associada a um risco aumentado de tromboembolismo venoso (OR ajustada de 17,7, IC de 95%: 1,97-158,6; OR mediada de 20, IC de 95%: 2,14-187,2), mas não de hipertensão em ambas as análises ajustada e mediada. Da mesma forma, a hipertensão não foi associada aos níveis de testosterona nem às prescrições de terapia hormonal nos homens trans. O infarto do miocárdio ocorreu com pouca frequência em ambos os grupos (11 nas mulheres trans, 2 nos homens trans), e o tromboembolismo venoso ocorreu em apenas 3 homens trans, números que os autores determinaram como pequenos demais para análise estatística.

Este estudo contém ameaças à sua validade, incluindo a idade relativamente baixa da população e a baixa taxa dos eventos. Além disso, a pequena porcentagem dos indivíduos que não receberam a terapia hormonal têm uma probabilidade razoavelmente mais alta de terem uma história de doença cardiovascular conhecida, tornando difícil que esses dados se apliquem a um grupo de maior risco. Os autores incluíram a maioria dos fatores de confusão típicos na análise, mas não incluíram o uso de tabaco. Uma crítica mais ampla à pesquisa em saúde de transgêneros deve incluir uma discussão sobre a limitação do financiamento para esse tipo de pesquisa e a resultante escassez de evidências para os clínicos. Melhorar os desfechos para os pacientes transgêneros exige pesquisas mais robustas. Este estudo reduz, mas não elimina, as incertezas na assistência aos pacientes transgêneros.

Para mais informações, veja os tópicos Terapia hormonal para adultas transgêneros femininas e Terapia hormonal para adultos transgêneros masculinos na DynaMed.

Equipe Editorial do MBE em Foco da DynaMed

Este MBE em Foco foi escrito por Carina Brown, MD, professora assistente na residência em Medicina de Família da Cone Health. Editado por Alan Ehrlich, MD, editor executivo da DynaMed e professor associado de Medicina de Família da faculdade de medicina da Universidade de Massachusetts, Dan Randall, MD, editor adjunto para Medicina Interna da DynaMed, e Katharine DeGeorge, MD, MS, professora associada de Medicina de Família da Universidade da Virginia e editora clínica da DynaMed.