Conclusão prática: A fenilefrina oral, encontrada em muitos antigripais, não é efetiva para a congestão nasal.
Pérola da MBE: Os ensaios clínicos abertos, por definição, não têm mascaramento, e têm risco de viés a favor da intervenção. Um ensaio aberto bem conduzido que não encontra benefícios, por outro lado, é uma evidência forte de que ensaios adicionais provavelmente também não demonstrarão benefício.
Se você ainda não tinha ouvido falar, as formulações orais que contêm fenilefrina provavelmente serão retiradas das prateleiras das farmácias nos EUA em breve. Em setembro de 2023, um comitê consultivo da FDA concluiu que as apresentações orais da fenilefrina não são mais “GRASE” (“Generally Recognized As Safe and Effective”, ou geralmente reconhecidas como seguras e efetivas) para o tratamento da congestão nasal devido a um corpo crescente de evidências de que esse medicamento não é mais efetivo que placebo. Embora a FDA ainda não tenha tomado uma decisão final para ordenar a remoção do medicamento de suas monografias de venda livre (o que afetaria a rotulagem), a recomendação em si está gerando manchetes e provavelmente já está afetando as vendas. No entanto, a ausência de eficácia não é exatamente uma novidade do ponto de vista das evidências.
Para começar, o corpo de evidências é pequeno, com muito poucos ensaios da fenilefrina oral. Isso provavelmente ocorre porque os ensaios geralmente são projetados (e financiados) com base em uma hipótese de que uma intervenção deveria funcionar, muitas vezes com base na fisiopatologia ou na farmacocinética. Bem, já sabíamos que a fenilefrina é inativada no intestino e geralmente não atinge níveis limiares de biodisponibilidade no soro. Ela já não deveria funcionar pela teoria, e os dados mostram que ela não funciona na prática. O mesmo não ocorre com as apresentações intranasal e intravenosa.
A melhor evidência que temos é um ensaio aberto de 2015 solicitado pela FDA que comparou doses de fenilefrina oral que variaram de 10 a 40mg a cada 4h por 7 dias com placebo em 539 adultos com rinite alérgica sazonal, o qual não conseguiu encontrar uma diferença significativa em uma escala de 4 pontos de melhora subjetiva. E, por nenhuma diferença significativa, queremos dizer resultados quase idênticos comparando todas as 4 doses com o placebo, incluindo intervalos de confiança quase idênticos. Não foi observada nem mesmo um indício de tendência à significância neste ensaio aberto, e nenhuma sugestão de que o estudo deva ser repetido. Há também várias revisões sistemáticas que concluíram que a fenilefrina oral não funciona melhor que placebo, mas muitos dos estudos analisaram formulações nasais e orais combinadas da substância, o que torna difícil separar a magnitude do benefício (ou da falta dele) de qualquer uma das duas.
Do ponto de vista logístico, é importante notar que a ordem da FDA teoricamente só pode se aplicar às formulações em que a fenilefrina oral é o único ingrediente ativo, mas muitos remédios para resfriados de venda livre são associações (como Coristina® e Benegrip®, que contêm fenilefrina). É possível que a fenilefrina oral tenha um benefício sinérgico ou aditivo no tratamento da congestão nasal, mesmo que a monoterapia seja inefetiva. Mas podemos prever que um cancelamento da monografia de venda livre pela FDA desencadeará reformulações generalizadas de produtos de venda livre na indústria. A fenilefrina oral teve um aumento em seu uso desde 2006, quando a pseudoefedrina, mais efetiva, foi colocada atrás dos balcões nas farmácias devido a preocupações quanto à sua segurança porque estava sendo usada para fabricar a droga de abuso metanfetamina.
Para fins de clareza, as preocupações de segurança não tiveram nenhum papel na recomendação do cancelamento da monografia pela FDA para as formulações orais que contêm fenilefrina. Vale ressaltar, no entanto, que pode haver problemas de segurança quando as pessoas não percebem o que estão tomando. As empresas farmacêuticas dependem do reconhecimento das suas marcas, mas produtos com nomes semelhantes, particularmente os produtos com associações, podem confundir até o consumidor mais experiente. Você é capaz de nomear cada ingrediente encontrado em produtos combinados como o Resfenol®, o xarope Vick® ou os muitos subtipos de Naldecon®? Você sabia que o Tylenol Sinus® contém pseudoefedrina, enquanto o Tylenol DC® tem cafeína?
Então, agora que estamos nariz a nariz com a temporada de gripes e resfriados, o que dizer aos pacientes que vêm com congestão nasal? Bem, as apresentações intranasais da fenilefrina ainda têm alguma eficácia comprovada (desde que sejam usadas por no máximo 3 dias consecutivos para evitar a rinite de rebote). Além disso, há sempre o bom e velho irrigador (“neti pot”, ou “lota”), que é a maneira mais efetiva e mais desagradável de desobstruir as vias nasais.
Para mais informações veja o tópico Infecção de vias aéreas superiores (IVAS) viral em adultos e adolescentes na DynaMed.
Equipe editorial do MBE em Foco da DynaMed
Este MBE em Foco foi escrito por Katharine DeGeorge, MD, MSc, editora-adjunta sênior da DynaMed e professora associada de Medicina de Família na Universidade da Virgínia. Editado por Alan Ehrlich, MD, FAAFP, editor executivo da DynaMed e professor associado de Medicina de Família na faculdade de medicina da Universidade de Massachusetts; Dan Randall, MD, MPH, FACP, editor adjunto da DynaMed; Nicole Jensen, MD, médica de família na WholeHealth Medical; Vincent Lemaitre, PhD, editor médico da DynaMed; Elham Razmpoosh, PhD, pesquisadora em pós-doutorado na Universidade McMaster; Sarah Hill, MSc, medical writer na DynaMed; Hannah Ekeh, MA, editora associada sênior da DynaMed; e Jennifer Wallace, BA, editora associada sênior da DynaMed. Traduzido para o português por Cauê Monaco, MD, MSc, docente do curso de medicina do Centro Universitário São Camilo.