Referência: JAMA Intern Med 2023 Jun 1; 183(6):554-564
Conclusão prática: O paxlovid parece reduzir a mortalidade e o risco de COVID longa em pessoas de alto risco.
Pílula da MBE: Os dados de desfechos de estudos observacionais são geralmente considerados menos definitivos do que dados de ensaios clínicos randomizados, mas os dados observacionais têm o poder de gerar novas hipóteses que podem mudar a direção das pesquisas futuras.
Quando os relatos de uma "COVID de longa duração" surgiram pela primeira vez no início de 2020, alguns de nós tivemos flashbacks de síndromes descritas anteriormente, como a encefalomielite miálgica/síndrome da fadiga crônica (ME/CFS) e a síndrome da doença de Lyme pós-tratamento. Como se vê, muitas pessoas que tiveram COVID são relatam experienciar sintomas e incapacidade em longo prazo, bem como taxas mais altas de doenças hepática, renal, pulmonar e cardiovascular/metabólica que podem ser tanto graves quanto duradouras.
Recentemente, pesquisadores realizaram uma análise retrospectiva de coorte das taxas de problemas de saúde iniciados após uma infecção por COVID-19 em cerca de 300.000 veteranos, comparando aqueles que receberam nirmatrelvir* dentro de 5 dias após o início dos sintomas (37.466) com os que não receberam tratamento. Os participantes eram principalmente homens idosos com pelo menos um fator de risco para desfechos graves da COVID-19 em curto prazo. A maioria tinha sobrepeso e havia sido vacinada. Os pesquisadores tentaram ajustar as comparações com base nas doenças pré-existentes e nas características demográficas usando análises de propensão. De modo não surpreendente, a mortalidade a 30 dias foi significativamente menor naqueles que receberam a medicação versus aqueles que não a receberam (4,7% vs. 13,4%; aqueles que faleceram foram excluídos da análise do desfecho de doença de início após a COVID). No entanto, o tratamento também reduziu significativamente a incidência de complicações pós-COVID a 180 dias, com uma redução do risco absoluto de 4,51% (IC de 95%: 4,01-4,99).
O que foi mais interessante, no entanto, foi a maneira como os pesquisadores definiram "COVID longa": qualquer uma de treze doenças distintas diagnosticadas 30 dias após a infecção inicial por COVID. A lista incluiu não apenas sintomas como fadiga/mal-estar, dispneia e mialgia, mas também complicações objetivas, como lesão renal aguda, embolia pulmonar ou arritmia. Os resultados mostraram que, entre 30 dias e 6 meses, o grupo tratado foi menos propenso a ter qualquer um desses 13 diagnósticos, embora a probabilidade de diabetes de início recente, doença hepática ou tosse não tenha sido significativamente diferente. O interessante para os céticos entre nós foi que a redução de sintomas como alterações cognitivas ou dispneia foi quase paralela a uma redução dos diagnósticos objetivos, como embolia pulmonar ou doença cardíaca isquêmica, as quais teríamos considerado complicações da COVID em vez de partes de uma síndrome.
Quando a maioria de nós pensa nos pacientes em nosso consultório como tendo "COVID-longa" pensamos em dispneia, fadiga, disautonomia e comprometimento neurocognitivo. Muitos de nós podem não considerar complicações objetivas da COVID, como embolia pulmonar e arritmia, como estando na mesma categoria. Embora ainda estejamos longe de uma definição universalmente aceita da COVID longa, nossa busca por essa clareza poderia potencialmente nos ajudar a entender melhor outras síndromes misteriosas, como a ME/CFS... ou talvez entende-las de forma diferente. Embora possa haver controvérsia sobre a maneira como os autores deste estudo agruparam sintomas e achados objetivos, talvez o que mais importe é que o nirmatrelvir parece ser efetivo para prevenir ambos.
*Os autores apenas afirmam explicitamente que os pacientes receberam nirmatrelvir, mas após consulta com nossos colegas farmacêuticos, achamos que é seguro assumir que os participantes receberam a associação nirmatrelvir-ritonavir (Paxlovid).
Para obter mais informações, consulte o tópico COVID-19 no DynaMed.
Equipe editorial do MBE em Foco da DynaMed
Este MBE em Foco foi escrito por Dan Randall, MD, editor adjunto da DynaMed. Editado por Alan Ehrlich, MD, editor executivo da DynaMed e professor associado de Medicina de Família na faculdade de medicina da Universidade de Massachusetts; Katharine DeGeorge, MD, MSc, editora adjunta sênior da DynaMed e professora associada de Medicina de Família na Universidade da Virgínia; Nicole Jensen, MD, médica de família na WholeHealth Medical; Vincent Lemaitre, PhD, editor médico da DynaMed; Elham Razmpoosh, PhD, pesquisadora em pós-doutorado na Universidade McMaster; Hannah Ekeh, MA, editora associada sênior da DynaMed; e Jennifer Wallace, BA, editora associada da DynaMed. Traduzido para o português por Cauê Monaco, MD, MSc, docente do curso de medicina do Centro Universitário São Camilo.