Reference: Neurology 2014 Nov 12 early online (evidência nível 2 [médio])
Baixos níveis de folato no sangue e níveis mais elevados de homocisteína plasmática têm sido associados a déficits de função cognitiva e aumento nos riscos de demência e doença de Alzheimer (J Nutr 2007 Jul;137(7):1789, Am J Clin Nutr 2005 Sep;82(3):636). A suplementação de vitamina B em populações de idosos tem tido resultados inconsistentes sobre a função cognitiva (Cochrane Database Syst Rev 2008 Oct 8;(4):CD004514, Am J Clin Nutr 2014 Jun 25;100(2):657), provavelmente devidos a heterogeneidades na população de interesse, no uso da suplementação vitamínica e na duração das intervenções. Recentemente, importantes agências de notícias relataram uma análise secundária de um estudo randomizado que avaliou o efeito do ácido fólico e da vitamina B12 diários vs. placebo por 2 anos em 3027 idosos (idade média de 74 anos) com níveis elevados de homocisteína, mas sem comprometimento cognitivo.
A função cognitiva global foi avaliada ao início e após dois anos com o uso do Mini Exame do Estado Mental (MMSE). Durante o período experimental, 26,8% dos pacientes interromperam a intervenção ou foram perdidos ao seguimento, mas os dados do MMSE estiveram disponíveis para 2.556 pessoas. Enquanto os níveis de homocisteína diminuíram significativamente em pessoas que receberam os suplementos de ácido fólico e vitamina B12 em comparação com os que receberam placebo (p <0,01), não houve diferença clinicamente significativa entre os grupos na função cognitiva ao MMSE (redução média de 0,3 pontos contra 0,1 pontos, p = 0,05). Não houve diferenças significativas entre os grupos quanto a outros domínios cognitivos, os quais foram avaliados apenas em um subgrupo de pacientes de um centro que realizou avaliações cognitivas adicionais.
Este estudo ilustra alguns aspectos interessantes da aplicação da pesquisa clínica na prática da medicina. À primeira vista, seus resultados sugerem que o folato e a vitamina B12 podem não afetar a função cognitiva em pessoas com altos níveis de homocisteína no aumento do risco de declínio cognitivo, e muitos médicos podem optar por mudar a prática com base nessa interpretação do ensaio. No entanto, como não houve declínio clinicamente significativo no grupo controle, é difícil dizer que a suplementação não tem valor clínico. Um ensaio de duração mais longa, ou um que avalie de modo mais sensível o declínio cognitivo do que o MMSE, seria necessário para avaliar verdadeiramente qualquer efeito benéfico sobre as alterações na função cognitiva. Além disso, o fato de que houve melhora significativa no nível de homocisteína, sem correspondente benefício clínico, destaca as limitações do uso de desfechos intermediários. Por fim, o desfecho primário deste trabalho foi, na verdade, determinar os efeitos de vitaminas do complexo B sobre o risco de fraturas osteoporóticas (BMC Geriatr 2011 Dec 2;11:80), e o seu efeito sobre a função cognitiva foi especificado como resultado secundário. Todos os participantes do ensaio receberam vitamina D3 para garantir status normal de vitamina D. Embora a vitamina D seja um fator importante no tratamento da osteoporose, níveis baixos de vitamina D têm sido associados ao declínio cognitivo (Neurology 2012 Sep 25;79(13):1397, Arch Intern Med 2010 Jul 12;170(13):1135) e, portanto, a suplementação pode ter confundido os resultados. Este artigo é um bom lembrete da importância de se avaliar criticamente os estudos de pesquisa, em especial aqueles que recebem atenção generalizada na imprensa leiga.
Para mais informações, veja os tópicos sobre Déficit cognitivo leve (DCL) no DynaMed.