Vacinação materna contra influenza pH1N1 de 2009 e risco de aborto espontâneo

MBE em Foco - Volume 5, Issue 5

Referencia: Vaccine 2017 Sep 25;35(40):5314

  • A vacinação contra a gripe é recomendada para mulheres grávidas. Numerosos estudos demonstraram segurança materna e fetal, mas evidências durante o início da gravidez são relativamente limitadas.
  • Um recente estudo de caso-controle avaliou as possíveis associações entre a vacinação materna com uma vacina inativa contra a gripe contendo os antígenos pandêmicos H1N1 de 2009 e o aborto espontâneo subsequente (SAB) em 485 mulheres com SAB e 485 controles correspondentes.
  • Uma associação estatística foi encontrada entre ter sofrido um SAB e ter sido vacinada contra influenza pH1N1 nos últimos 28 dias. No entanto, numerosos fatores limitam a interpretação e a relevância clínica deste estudo, e ele não deve ser usado para recomendar contra a vacinação para influenza durante a gravidez.

O United States Advisory Committee on Immunization Practices recomenda a vacinação contra influenza para mulheres gestantes devido a um maior risco de complicações e doença grave (MMWR 2017 Aug). Muitos estudos demonstraram segurança materna e fetal com a vacinação contra a gripe (Vaccine 2015, Clin Infect Dis 2015, BJOG 2015), mas a evidência durante o início da gestação é limitada (MMWR 2017 Aug). Um recente estudo do tipo caso-controle usou registros eletrônicos de saúde de um sistema de prestadores norte-americanos para avaliar possíveis associações entre a vacinação materna com uma vacina inativa contra a gripe contendo os antígenos H1N1 pandêmicos de 2009 (vacina pH1N1) e SAB subsequente (morte fetal em gestação de 5 a <20 semanas). O estudo se concentrou em eventos ocorridos durante as temporadas de gripe de 2010-2011 e 2011-2012. No estudo, 485 mulheres com idades compreendidas entre 18 e 44 anos que tiveram um SAB confirmado clinicamente ou por imagem durante as estações de gripe foram comparadas com controles pareadas, que foram mulheres que tiveram nascimento vivo ou morte fetal (em idade gestacional ≥ 20 semanas). Os controles foram acompanhados através da data da última menstruação, faixa etária materna (<30 anos vs. ≥ 30 anos) e plano de saúde. As mulheres que não estiveram continuamente vinculadas a um plano de saúde por ≥ 12 meses foram excluídas. A data de referência para cada par combinado foi a data estimada do SAB, e a probabilidade de ter uma vacinação anterior por pH1N1 foi comparada entre as mulheres que tiveram SAB e os controles correspondentes. Foram investigados três períodos de vacinação antes da data de referência: vacinação pH1N1 no prazo de 28 dias antes da data de referência (registrada em 62 mulheres [6% da coorte]), 29-56 dias antes (em 33 mulheres [3%]), e mais de 56 dias antes (em 155 mulheres [16%]).

Em comparação com as mulheres que não sofreram SAB, as mulheres que tinham sofrido um SAB tinham maior probabilidade de terem sido vacinadas contra pH1N1 nos 28 dias anteriores à data de referência (odds ratio ajustada: 2; IC de 95%: 1.1-3.6). Os resultados foram consistentes com as análises pós-hoc das mulheres avaliadas em 2010-2011, mas não em 2011-2012, e das mulheres que foram vacinadas no ano anterior, mas não entre as mulheres que não o foram. A probabilidade de ter sido vacinada contra pH1N1 29-56 dias ou > 56 dias antes da data de referência não foi significativamente maior entre as mulheres que tiveram SAB, com resultados consistentes para cada temporada analisada separada e independentemente das vacinações no ano anterior.

Este estudo caso-controle encontrou uma associação estatística entre ter sofrido um SAB e ter sido vacinada contra pH1N1 nos 28 dias anteriores, mas a interpretação desse achado é limitada por vários fatores. Primeiro, um estudo caso-controle tem maior viés do que um estudo de coorte, que compreende o tipo de estudo mais comum incluído em várias revisões sistemáticas recentes as quais não encontram associação entre vacinação materna contra influenza (de diferentes composições) e desfechos fetais desfavoráveis (Vaccine 2015, Clin Infect Dis 2015, BJOG 2015). Em segundo lugar, a associação entre SAB e vacinação contra pH1N1 nos 28 dias anteriores não foi consistente entre diferentes subgrupos de mulheres em análises pós-hoc. Em terceiro lugar, o número total de mulheres vacinadas no período de 28 dias antes da data de referência foi pequeno (apenas 62 mulheres, 21 das quais também foram vacinadas no ano anterior). Os dois últimos fatores levantam a questão sobre se a associação estatística observada representa uma associação verdadeira ou um artefato estatístico. Em quarto lugar, um possível problema de confusão que não foi explicitamente abordado é o de que as mulheres que recebem uma vacina contra gripe podem ter maior probabilidade de procurarem um médico se tiverem um SAB. Técnicas analíticas, como o uso de escores de propensão para orientar a seleção dos controles, podem ter abordado esse viés. Além disso, as vacinas não registradas nos prontuários eletrônicos, como as fornecidas por um empregador ou uma clínica independente, não foram incluídas.

Por fim, estudos prévios não encontraram associação entre as diferentes vacinas contra a gripe e desfechos fetais desfavoráveis, enquanto este estudo encontrou uma associação entre uma vacina específica e SAB em mulheres selecionadas. A relevância dessa associação para vacinas subsequentes com diferentes composições não é clara (de fato, diferentes cepas compreendem a vacina recomendada neste ano, WHO 2017 Mar, MMWR 2017 Aug). Também não está claro como a potencial associação encontrada neste estudo caso-controle (que não pode estimar o risco absoluto de se ter um SAB após uma vacinação) se compara às associações entre a infecção materna por influenza e os desfechos maternos, fetais e do parto, incluindo morte fetal (BJOG 2017, Hum Reprod 2014, Obstet Gynecol Clin North Am 2015, Am J Obstet Gynecol 2012). A segurança de qualquer produto farmacêutico é importante e este estudo fornece resultados geradores de hipóteses para motivar estudos mais rigorosos, como estudos de coorte de alta qualidade. Os resultados deste estudo devem ser interpretados com cautela e não devem ser utilizados para recomendar contra a vacinação para influenza durante a gravidez.

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